quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Cinema: «Nome de código: Cloverfield»


«Nome de código: Cloverfield» - Um monstro à antiga num mundo tecnológico

Os últimos meses foram passados a tentar perceber o que seria Cloverfield. No início não havia nome, apenas confusão. Depois foi mostrado o monstro. A cabeça da Estátua da Liberdade rolava e a handycam nervosa fazia lembrar O projecto de Blair Witch.

Hoje chega finalmente às salas de cinema o filme que tanto burburinho causou. Obra artística, experiência de entretenimento ou óptima campanha de marketing, as opiniões podem divergir. A certeza é que todos já ouviram falar de Cloverfield.


O conceito é do mais simples que há: um monstro de proporções titânicas ataca Manhattan e o espectador acompanhará uma história de sobrevivência de um grupo de jovens cuja noite de festa foi interrompida pela infeliz criatura. Melhor, o espectador não acompanha. O espectador torna-se num desses jovens já que todo o filme é apresentado através da lente da câmara de um deles.


A premissa é tão linear quanto isto e vai de volta aos tempos em que um filme com um monstro deixava as mãos suadas agarradas à cadeira e em que os saltos eram involuntários.


É um blockbuster na sua mais pura condição, feito com um baixo orçamento e que prova que nem sempre é preciso gastar milhões nem investir em novidades técnicas mirabolantes para dar ao público o entretenimento pretendido. Talvez para isso tenha contribuído a inteligente campanha de marketing a que temos assistido em todo o mundo.
Deixou milhares obcecados com o que seria este projecto de J.J. Abrams (criador da série Lost) e fez com que muitos seguissem as pistas e engendrassem teorias no espaço virtual. Primeiro, especulou-se sobre o nome do filme. Nos cartazes lançados apenas se via uma Estátua da Liberdade sem cabeça e a data de estreia. Depois, o termo Cloverfield começou a rodar pelas notícias de cinema e por toda a rede cinéfila na internet.


Nos últimos tempos, algumas amostras foram escapando. O primeiro clip mostrava apenas uma festa e depois o pânico. O último vídeo deixado à solta mostrava cinco minutos do filme, a cabeça da famosa estátua e uma monstro a passear-se pelos arranha-céus de Manhattan. Com pouco dinheiro, estava construído o caminho para que a ansiedade dos mais curiosos precisasse de ser satisfeita.



Em Portugal, decidiu fazer-se uma antestreia fora do circuito comum. Os convidados ocuparam uma sala no Metro do Terreiro do Paço e experimentaram Cloverfield num espaço semelhante ao de uma das cenas mais cortantes da fita. Foi uma experiência bem ao jeito americano, com filas para entrar e corridas até aos melhores lugares. Durante a exibição do filme, era fácil perceber que a envolvente da sala era um factor com impacte na reacção do público. Não houve cadeira que não estremecesse pelo menos um bocadinho.


Hoje, Cloverfield passa dos mistérios e dos espaços escuros para as salas de cinema convencionais e, se seguir a tendência dos Estados Unidos, vai ser um sucesso de bilheteira. Em terras norte-americanas, teve o melhor fim-de-semana de abertura de sempre no mês de Janeiro.


Para lá da sinopse tão badalada, é curioso atentar nos pormenores. Está lá o olhar intruso, o lado voyeurista. Não falta quem, sem se preocupar com o monstro gigante, filme o cenário com um telemóvel. Há ainda, tal como vimos recentemente em The Host- A criatura, a ideia de que o monstro terá sido criado pelo Homem. Há, finalmente, imagens que imediatamente podem ser associadas à representação de um ataque terrorista.


Por cá, quem comprar bilhete para o ver vai para algo que será decerto entendido de formas muito diferentes. Será uma obra cinematográfica a ser lembrada ou uma experiência de entretenimento na sua mais sincera condição? Talvez faça sentido perguntar se, tal como tudo o resto, também o cinema possa estar a entrar numa era mais interactiva em que o público passará a entendê-lo como uma experiência que começa bem antes do filme e não como uma simples sessão estática.


De Cloverfield, para além deste Godzilla/King Kong dos tempos modernos que atormenta uma história de amor em Nova Iorque, será lembrado o formato. No final, o público sabe que ajudou a construir o monstro e que quase foi atacado por ele.

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